TDAH tem direito ao BPC? Guia completo e prático

Se você busca saber se TDAH tem direito ao BPC, provavelmente convive com o transtorno em casa e quer entender, de forma direta, quando o TDAH pode garantir o Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS). A boa notícia é que o BPC não depende de contribuições ao INSS e pode ser pago a pessoas com deficiência de qualquer idade. Este guia explica como os órgãos avaliam o TDAH, o que entra na avaliação biopsicossocial, passo a passo para pedir, documentos úteis e como recorrer se vier um indeferimento.

TDAH tem direito ao BPC/LOAS

QUEM TEM DIREITO: COMO A LEI DEFINE "DEFICIÊNCIA" PARA O BPC

Impedimento de longo prazo e barreiras

A legislação brasileira considera pessoa com deficiência quem possui impedimento de longo prazo (físico, mental, intelectual ou sensorial) que, em interação com barreiras, restringe a participação em igualdade de condições com as demais pessoas. Não é o rótulo diagnóstico que define o direito, mas o efeito prático daquela condição sobre a vida diária, aprendizado, autonomia e participação social da pessoa.

TDAH pode caracterizar deficiência?

Sim, pode, quando o TDAH gerar impedimentos de longo prazo que limitem de forma significativaatividades e participação (por exemplo, aprendizagem, autonomia, convivência, socialização, cuidado pessoal), e houver barreiras no contexto (escola, família, comunidade). Na prática, a avaliação é biopsicossocial: equipe multiprofissional analisa funções, atividades e participação, além de fatores ambientais, psicológicos e pessoais.

Atenção às provas

Laudos médicos atualizados (com CID), relatórios pedagógicos (adaptações, faltas, desempenho), de terapeutas (fono, TO, psicologia), prontuário do CAPSij (quando houver), Plano Terapêutico Singular, histórico de PSE na escola. Esses documentos mostram como o TDAH impacta na prática. Há decisões reconhecendo BPC para TDAH quando a perícia constatou prejuízos funcionais importantes; outras negam quando não se verificou deficiência "qualificada". Isso reforça que não é automático: o conjunto probatório e o contexto são decisivos.

CRITÉRIO DE RENDA, FLEXIBILIZAÇÕES E NOVIDADES (2024–2025)

Renda familiar per capita

A regra geral exige renda familiar per capita ≤ ¼ do salário mínimo. Mas a jurisprudência pacífica do STJ firmou entendimento de que esse limite não é absoluto: é indício objetivo de miserabilidade, podendo o julgador considerar outros elementos(despesas excepcionais com saúde/terapias, endividamento por tratamento, necessidade de cuidador etc.). Isso é vital quando o indeferimento ocorreu por renda "um pouco" acima do corte.

Políticas recentes importantes

Reavaliação periódica: a norma reforça a reavaliação a cada 2 anos para pessoas com deficiência, com diretrizes operacionais atualizadas; há hipóteses de dispensa quando há retorno ao BPC após trabalho com auxílio-inclusão.

Variação de renda e incentivo ao trabalho: política recente evita a interrupção abrupta do apoio quando há variação temporária de renda e incentiva a inclusão produtiva via auxílio-inclusão (metade do BPC) para quem ingressa no mercado cumprindo os requisitos.

Regulamento do BPC (Decreto 10.955/2022): consolida procedimentos e parâmetros de avaliação no âmbito do SUAS/INSS (articulação CRAS–INSS, fluxos e responsabilidades).

Dica prática

Guarde comprovantes de despesas recorrentes (medicação não padronizada, terapias particulares quando não há oferta SUS, transporte para tratamento). Eles ajudam a dimensionar a vulnerabilidade real na entrevista social e, se necessário, em recurso. Documentar todas as despesas relacionadas ao tratamento do TDAH fortalece a demonstração da situação de vulnerabilidade familiar.

AVALIAÇÃO BIOPSICOSSOCIAL: O QUE É ANALISADO E COMO SE PREPARAR

O que é avaliação biopsicossocial

A avaliação biopsicossocial é central no BPC por deficiência: realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar, considera impedimentos corporais, limitações nas atividades, restrições de participação e barreirasdo ambiente (família, escola, comunidade, serviços públicos). É esse conjunto — e não apenas o diagnóstico — que dirá se o TDAH configura deficiência para fins do benefício.

Como se preparar

1. Laudos médicos recentes com CID, histórico de tratamento, medicações, comorbidades (ex.: ansiedade, dislexia, TEA), evolução e prognóstico.

2. Relatórios pedagógicos (coordenação/professores): medidas de adaptação, registros de faltas, atendimento educacional especializado, planos individualizados, desempenho e socialização.

3. Relatórios terapêuticos (psico, TO, fono, neuropsiquiatria): descrição objetiva do funcionamento (atenção sustentada, funções executivas, impulsividade, autorregulação), atividades da vida diária e participação.

4. Documentos sociais: visitas domiciliares, parecer do CRAS, prontuários de CAPSij, listas de esperapor terapia, comprovação de barreiras (ex.: ausência de serviços, transporte, tecnologia assistiva).

Erros comuns a evitar

Apenas anexar laudo com diagnóstico sem descrever como isso limita atividades e participação; não levar relatórios escolares; não evidenciar barreiras (ex.: ausência de transporte para terapia). Diagnóstico não basta — é preciso mostrar o impacto.

Dica extra: peça que os relatórios usem linguagem funcional (ex.: "não consegue manter atenção por >10 min em atividades dirigidas", "impulsividade exige supervisão constante", "dificuldade de planejamento impede realização autônoma de tarefas escolares"). Essa linguagem dialoga com os instrumentos da avaliação.

PASSO A PASSO: COMO PEDIR O BPC PARA TDAH

1. CadÚnico / CRAS

Antes de tudo, inscreva-se no CadÚnico (ou atualize dados) no CRAS do seu município. Sem CadÚnico atualizado, o pedido costuma ser indeferido. Leve documentos de todos os moradores e comprovantes de renda. O CRAS é a porta de entrada para o processo e fundamental para a análise da vulnerabilidade social.

2. Agendamento / Requerimento no INSS

Com CadÚnico ok, faça o pedido do BPC pelo Meu INSS (site/app) ou telefone 135. Selecione "Benefício Assistencial à Pessoa com Deficiência". Anexe todos os documentos médicos, escolares e terapêuticos digitalizados. Quanto mais completa a documentação inicial, maiores as chances de análise favorável.

3. Entrevista social / Perícia biopsicossocial

Você será chamado para entrevista social (assistente social) e avaliação médica. Leve todos os documentos(médicos, escolares, terapêuticos, despesas). Seja objetivo ao descrever as limitações e dificuldades enfrentadas no dia a dia. A entrevista social é fundamental para avaliar o contexto familiar e as barreiras enfrentadas.

4. Acompanhe e responda exigências

Se o INSS pedir documentos adicionais, envie no prazo. Acompanhe o andamento pelo Meu INSS. Não deixe de responder exigências, pois o não atendimento pode resultar em indeferimento automático do pedido.

5. Resultado

Se deferido, o BPC paga 1 salário mínimo e não dá 13º nem pensão por morte; é pessoal e intransferível. Em caso de indeferimento, você pode recorrer administrativamente ou buscar orientação jurídica para avaliar as chances na via judicial.

INDEFERIRAM? COMO RECORRER (ADMINISTRATIVO E JUDICIAL)

Recurso administrativo

No próprio Meu INSS, dentro do prazo. Argumente com base em:

LBI (art. 2º) para reforçar que deficiência = impedimento + barreiras (não é só CID).
Relatórios funcionais novos (escola/terapias) mostrando limitações e restrições de participação.
Despesas que afetam a renda real da família (medicação fora da RENAME, terapias não ofertadas, transporte).
REsp 1.112.557/MG (STJ) se a renda estiver um pouco acima de ¼ do mínimo: peça análise global da vulnerabilidade.
Normas recentes do MDS/INSS (reavaliação, variação de renda) quando houver emprego intermitente na família ou volta ao mercado.

Via judicial

Quando o conjunto probatório é forte (impedimento de longo prazo demonstrado) e a renda "excede por pouco" devido a circunstâncias excepcionais, a Justiça tem reconhecido o direito. Há decisões específicas envolvendo TDAH com resultados favoráveis e desfavoráveis, o que reforça a importância da prova funcional e da perícia judicial. A perícia judicial costuma ser mais detalhada que a administrativa, aumentando as chances de reconhecimento do direito quando há documentação robusta.

MANUTENÇÃO, REAVALIAÇÃO E TRABALHO: O QUE MUDA NO DIA A DIA

Reavaliação a cada 2 anos

A regra é confirmar periodicamente se permanecem o impedimento e a vulnerabilidade; diretrizes recentes esclareceram procedimentos e dispensas específicas. Mantenha sempre atualizados os documentos médicos, escolares e terapêuticos para as reavaliações. A falta de comparecimento ou de documentação pode resultar em suspensão do benefício.

Trabalho e inclusão produtiva

Começou a trabalhar? Em vez de perder o BPC de imediato, avalie o auxílio-inclusão (metade de 1 salário mínimo) — política de transição segura para o mercado. O auxílio-inclusão permite que a pessoa com deficiência ingresse no mercado de trabalho sem perder totalmente o apoio da assistência social, facilitando a transição gradual para a independência financeira.

Mudanças familiares

Entrada/saída de membros do grupo familiar, empregos temporários e transferências podem alterar a renda per capita; comunique ao CadÚnico/CRAS. Para famílias com TDAH, renda instável e custos de tratamento, documentar tudo e manter CadÚnico atualizado é metade do caminho para evitar suspensões indevidas e convocações desnecessárias.

PRINCIPAIS PONTOS (PARA SALVAR E COMPARTILHAR)

TDAH pode dar direito ao BPC

Se houver impedimento de longo prazo com barreiras que limitem participação, comprovado em avaliação biopsicossocial.

Renda per capita

Regra de ¼ do salário mínimo, mas não é critério absoluto (STJ admite análise global da vulnerabilidade).

Passo a passo

CadÚnico/CRAS → Meu INSS → entrevista social + perícia; anexe laudos, relatórios escolares e terapêuticos.

Reavaliação

Via de regra, bienal, com novas diretrizes e dispensas específicas.

Trabalho

Considere o auxílio-inclusão para transição ao mercado, evitando perder a proteção de uma vez.

Base legal

LBI (conceito de deficiência) + Decreto 10.955/2022 (Regulamento BPC) sustentam pedidos e recursos.

PERGUNTAS FREQUENTES (FAQ)

1) O diagnóstico de TDAH dá direito automático ao BPC?

Não. É preciso provar deficiência no sentido legal (impedimento de longo prazo + barreiras) e vulnerabilidade de renda.

2) Qual é a renda exigida para o BPC?

Regra geral: ¼ do salário mínimo per capita. A Justiça pode relativizar quando houver prova robusta de vulnerabilidade.

3) Criança com TDAH pode receber BPC?

Pode, se os impedimentos forem relevantes e documentados (relatórios escolares/terapias) e a renda familiar se enquadrar. Há casos noticiados e decisões judiciais favoráveis.

4) O que é avaliação biopsicossocial?

Exame por equipe multiprofissional que considera funcionamento, atividades, participaçãoe barreiras do contexto.

5) Preciso passar no CRAS antes?

Sim. CadÚnico/CRAS é condição prática para o pedido e para verificação da renda familiar.

6) O BPC tem 13º ou vira pensão por morte?

Não. BPC não paga 13º e não gera pensão. Consulte as cartilhas do INSS para detalhes de manutenção/reavaliação.

7) Comecei a trabalhar, perco o BPC?

Há regra de transição via auxílio-inclusão para estimular a inclusão produtiva sem romper a proteção de forma brusca.

8) O que anexar no pedido por TDAH?

Laudos médicos com CID, relatórios escolares, pareceres de psicologia/TO/fono, comprovantes de despesase barreiras enfrentadas.

CONCLUSÃO

A pergunta "TDAH tem direito ao BPC?" não tem resposta automática, mas condicionada: sim, pode ter, quando o TDAH produz impedimentos de longo prazo que, com barreiras, limitam atividades e participação — e quando a família está em vulnerabilidade econômica.

O que decide o processo é prova de funcionalidade, contexto social e documentação coerente. Por isso, preparar laudos médicos e relatórios escolares/terapêuticos com linguagem funcional é decisivo.

Se o pedido for negado por renda "um pouco acima", avalie recurso com base na jurisprudência do STJ que admite análise global da vulnerabilidade. E, se a pessoa com TDAH iniciar atividade remunerada, considerar o auxílio-inclusão pode ser a ponte ideal entre proteção social e autonomia.

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*Este conteúdo é informativo e não substitui avaliação jurídica individual.

Karoline Francisco Advogada